1. APRESENTAÇÃO
O cenário tributário brasileiro acaba de passar por uma transformação significativa com a promulgação da Emenda Constitucional nº 132/2023, marcando a versão final do tão debatido texto da Reforma Tributária. Há um reconhecimento generalizado da urgência e importância de modernizar o sistema tributário nacional, visando a correção de distorções que há tempos obstaculizam o crescimento econômico e o bem-estar da nação.
O sistema tributário vigente no Brasil é notoriamente complexo, gerando um elevado volume de litígios e custos de conformidade onerosos para as empresas. Essa complexidade contribui para a alocação ineficiente de capital, a falta de transparência nas operações, a retração dos níveis de investimento e, consequentemente, a desaceleração da produtividade da economia brasileira.
A imagem a seguir ilustra os tributos que atualmente incidem sobre o consumo de bens e serviços nas diferentes esferas governamentais:
Nota:
Em decorrência de estudos aprofundados, o Governo Federal submeteu ao Congresso Nacional dois Projetos de Leis Complementares cruciais para a regulamentação da Reforma Tributária:
- Projeto de Lei Complementar nº 68/2024: Institui o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo (IS). Atualmente em tramitação no Senado Federal, o regime de urgência para este projeto foi retirado em 04 de outubro de 2024, conforme despacho presidencial.
- Projeto de Lei Complementar nº 108/2024: Dispõe sobre o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (CG-IBS), o processo administrativo tributário concernente ao lançamento de ofício do IBS, a distribuição da arrecadação do IBS entre os entes federativos e o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD). Este projeto encontra-se em análise na Câmara dos Deputados.
Neste artigo, exploraremos como a Reforma Tributária, impulsionada pela Emenda Constitucional nº 132/2023 e agora complementada pela Lei Complementar nº 214/2025, busca simplificar a intrincada teia tributária do país através da implementação do Imposto de Valor Adicionado (IVA) dual. Este modelo consiste em um IVA Federal, denominado Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS), que unifica o PIS e a Cofins, e um IVA Estadual/Municipal/Distrital, chamado Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que engloba o ICMS (estadual) e o ISS (municipal).
Adicionalmente, a reforma introduz o Imposto Seletivo Federal (IS), que substituirá parcialmente o IPI. O IS incidirá sobre a produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, com o objetivo primordial de desestimular seu consumo, a exemplo de cigarros e bebidas alcoólicas.
Ao longo deste artigo, detalharemos as principais características do IBS, da CBS e do IS, além de elucidar as regras de transição que serão aplicadas para a implementação dessas novas sistemáticas tributárias.
2. DEMAIS NOVIDADES
A Reforma Tributária não se limita à reestruturação dos impostos sobre o consumo. Ela abrange outras importantes alterações em diferentes tributos, impactando diversos setores da economia e a vida dos cidadãos.
2.1 Simples Nacional
As microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP) optantes pelo Simples Nacional também serão afetadas pelas mudanças decorrentes da Reforma. De forma geral, essas empresas terão a opção de tributar a CBS e o IBS “por dentro” ou “por fora” desse regime simplificado.
Na modalidade de tributação “por dentro” do Simples Nacional, as empresas que adquirirem bens ou serviços de ME e EPP poderão se creditar do imposto e da contribuição cobrados nessas operações, tornando a cadeia produtiva mais eficiente.
Alternativamente, a ME ou EPP poderá optar por recolher a CBS e o IBS no regime normal de apuração, ou seja, “por fora” do Simples Nacional, adotando a não cumulatividade ampla desses tributos, sem que isso implique a exclusão do regime simplificado em relação aos demais impostos. Essa flexibilidade visa atender às diferentes necessidades e modelos de negócio das pequenas empresas.
2.2 ITCMD (heranças e doações)
O texto da reforma tributária aprovado pelo Congresso Nacional introduziu alterações significativas no Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), com o objetivo de torná-lo mais equitativo e eficiente:
- Progressividade: A alíquota do imposto passará a ser progressiva, aumentando conforme o valor da herança ou da doação. Essa medida busca onerar de forma mais justa as transmissões de maior valor.
- Competência: A competência para a cobrança do imposto sobre bens móveis, títulos e créditos será transferida para o Estado de domicílio do de cujus (falecido) ou do doador. Essa mudança visa simplificar a arrecadação e evitar conflitos de competência entre os estados.
- Isenção: Será concedida isenção do imposto sobre as transmissões de bens e direitos para entidades sem fins lucrativos que possuam finalidade de relevância pública e social, incluindo organizações assistenciais e beneficentes de entidades religiosas e institutos científicos e tecnológicos. Essa medida busca incentivar o trabalho dessas instituições.
2.3 IPTU
No tocante ao Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), a Emenda Constitucional conferiu maior autonomia aos municípios, permitindo que atualizem a base de cálculo do imposto com base em critérios estabelecidos em lei municipal. Essa alteração visa modernizar a tributação imobiliária e permitir que os municípios arrecadem de forma mais justa, refletindo o valor real dos imóveis.
2.4 IPVA
Em relação ao Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), as alterações introduzidas pela reforma são notáveis:
- Extensão da Cobrança: A cobrança do imposto será estendida à propriedade de veículos automotores terrestres, aquáticos e aéreos. No entanto, foram estabelecidas algumas exceções importantes:
- Aeronaves agrícolas e de operador certificado para prestar serviços aéreos a terceiros.
- Embarcações de pessoa jurídica que detenha outorga para prestar serviços de transporte aquaviário ou de pessoa física ou jurídica que pratique pesca industrial, artesanal, científica ou de subsistência.
- Plataformas suscetíveis de se locomoverem na água por meios próprios, inclusive aquelas cuja finalidade principal seja a exploração de atividades econômicas em águas territoriais e na zona econômica exclusiva, e embarcações que tenham essa mesma finalidade principal.
- Tratores e máquinas agrícolas.
- Alíquotas Diferenciadas: O imposto poderá ter alíquotas diferenciadas em função de características como tipo, valor, utilização e, principalmente, o impacto ambiental do veículo. Essa medida visa incentivar a aquisição de veículos menos poluentes, com a aplicação de alíquotas mais elevadas para veículos com maior impacto ambiental.
Legislação Referenciada:
- Emenda Constitucional nº 132/2023
- Lei Complementar nº 214/2025