O comodato é uma figura jurídica essencial no universo empresarial, especialmente quando há a necessidade de empréstimo gratuito de bens não fungíveis. Diferente de uma venda ou mesmo de um aluguel, o comodato não envolve transferência de propriedade e, por sua gratuidade, possui um tratamento fiscal distinto que exige atenção.
Comodato vs. Mútuo: A Distinção Fundamental
Para compreender o comodato, é crucial diferenciá-lo do mútuo. O Código Civil Brasileiro (Lei nº 10.406/2002) é claro ao definir ambos:
- Comodato (Art. 579): “O comodato é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis. Perfaz-se com a tradição do objeto.”
- Coisa não fungível: Aquela que não pode ser substituída por outra de mesma espécie, qualidade e quantidade (por exemplo, uma máquina específica, um veículo com características únicas).
- Não há transmissão da propriedade: O comodatário (quem recebe o bem) utiliza a coisa, mas o domínio continua com o comodante (quem empresta).
- Mútuo (Art. 586 e 587): “O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade. Este empréstimo transfere o domínio da coisa emprestada ao mutuário, por cuja conta correm todos os riscos dela desde a tradição.”
- Coisa fungível: Aquela que pode ser substituída por outra de mesma espécie, qualidade e quantidade (por exemplo, dinheiro, grãos, combustíveis).
- Há transmissão da propriedade: O mutuário se torna proprietário da coisa emprestada e deve restituir uma equivalente.
Essa distinção é fundamental no aspecto fiscal: enquanto o mútuo geralmente utiliza o CFOP 5.949 (outra saída de mercadoria ou prestação de serviço não especificada), o comodato se enquadra nos CFOPs específicos 5.908/6.908 para remessa e 5.909/6.909 para retorno.
Remessa de Bens em Comodato: Emissão da Nota Fiscal
Ao remeter um bem em regime de comodato, o comodante deve emitir uma Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) com as seguintes características:
- CFOP (Código Fiscal de Operações e Prestações): 5.908 (operações internas) ou 6.908 (operações interestaduais).
- Natureza da Operação: “Remessa de bem por conta de contrato de comodato ou locação”.
- CST ICMS (Código de Situação Tributária do ICMS): 41 – Não tributada (para empresas do Regime Normal) ou CSOSN 400 – Não tributada pelo Simples Nacional (para optantes do Simples Nacional).
- CST IPI (Código de Situação Tributária do IPI): 53 – Não tributada (para Regime Normal) ou 99 – Outras Saídas para Simples Nacional (para optantes do Simples Nacional).
- CST PIS/COFINS (Código de Situação Tributária do PIS/COFINS): 08 – Operação sem Incidência da Contribuição (para Regime Normal) ou 99 – Outras Operações para Simples Nacional (para optantes do Simples Nacional).
- Dados Adicionais/Informações Complementares: Deve constar a expressão “Não incidência do ICMS – Art. 7º, IX, XIV do RICMS-SP” (referência à legislação estadual específica que trata da não incidência em remessas e retornos de bens de uso, bem como comodato, no Estado de São Paulo).
Retorno de Bens Recebidos em Comodato: Emissão da Nota Fiscal
Quando o bem emprestado em comodato retorna ao comodante, o comodatário (ou o próprio comodante, dependendo do acordo e da necessidade) deve emitir uma NF-e de retorno com as seguintes informações:
- CFOP: 5.909 (operações internas) ou 6.909 (operações interestaduais).
- Natureza da Operação: “Retorno de bem recebido por conta de contrato de comodato ou locação”.
- CST ICMS: 41 – Não tributada / CSOSN 400 – Não tributada pelo Simples Nacional.
- CST IPI: 53 – Não tributada / 99 – Outras Saídas para Simples Nacional.
- CST PIS/COFINS: 08 – Operação sem Incidência da Contribuição / 99 – Outras Operações para Simples Nacional.
- Dados Adicionais/Informações Complementares: Deve constar a expressão “Não incidência do ICMS – Art. 7º, X, do RICMS-SP” e, obrigatoriamente, a chave de acesso da NF-e de remessa original referenciada no campo próprio do documento fiscal.
Observações Finais
- Referência de Documentos Fiscais: Para as NF-e de retorno (ou devolução, se aplicável em outras operações), é crucial que o documento fiscal original de remessa seja referenciado na NF-e de retorno, conforme o Ajuste SINIEF nº 20/19 e as disposições gerais de documentos fiscais eletrônicos.
- Contrato de Comodato: Embora a emissão da nota fiscal seja fundamental, a base legal da operação é o contrato de comodato, que deve ser formalizado entre as partes, detalhando as condições do empréstimo, o prazo e as responsabilidades.
O comodato, por ser uma operação sem fins lucrativos diretos e sem transferência de propriedade, recebe um tratamento tributário diferenciado, não gerando débitos ou créditos de ICMS, IPI, PIS e COFINS nas suas movimentações. A correta emissão da NF-e e a atenção aos CFOPs e CSTs são essenciais para garantir a conformidade fiscal da sua empresa.