A complexidade da legislação tributária brasileira frequentemente gera dúvidas para as empresas, especialmente no que tange à movimentação de bens e à incidência de impostos. A Resposta à Consulta Tributária 20704/2019, emitida pela Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo (SEFAZ-SP) em 20 de dezembro de 2019, oferece esclarecimentos cruciais sobre a remessa de materiais de uso e consumo por prestadoras de serviço para o local da prestação. Este artigo detalha as diretrizes estabelecidas por essa consulta, auxiliando empresas de limpeza e conservação a se adequarem às normas fiscais.
O Cenário da Consulta: Prestação de Serviços de Limpeza
A consulta foi formulada por uma empresa de limpeza e conservação (CNAE 81.29-0/00), que aloca seus funcionários nos estabelecimentos dos clientes para a execução dos serviços. A particularidade é que, embora a atividade esteja sujeita ao Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), os insumos utilizados (materiais de uso e consumo) são adquiridos pela prestadora como consumidora final.
A empresa busca clareza sobre como proceder com a remessa desses materiais de seu próprio estabelecimento (atuando como um centro de distribuição) para os locais de prestação de serviço, já que muitos clientes não possuem estrutura para armazená-los. Outra dúvida levantada é a possibilidade de o fornecedor entregar os materiais diretamente no endereço dos clientes.
Remessa dos Materiais do Centro de Distribuição da Prestadora
A primeira situação abordada pela consulta é a remessa dos materiais de uso e consumo do centro de distribuição da própria prestadora de serviços para o local da prestação. A SEFAZ-SP é clara ao afirmar que essa operação não configura hipótese de incidência do ICMS, conforme o artigo 7º, inciso VIII, do Regulamento do ICMS (RICMS/2000). Isso porque o material é de uso e consumo da prestadora, e não objeto de revenda ou transferência.
Para documentar essa remessa, a prestadora, mesmo não sendo contribuinte do ICMS em relação a essa operação, deve emitir uma Nota Fiscal Eletrônica (NF-e). As orientações são as seguintes:
- Destinatário: A própria empresa prestadora do serviço.
- Destaque do imposto: Sem destaque do ICMS.
- Informações Complementares: Inserir todas as informações relativas ao serviço a ser prestado, a menção de que se trata de uma operação sem incidência do ICMS (conforme o artigo 7º, inciso VIII, do RICMS/2000) e, por cautela, o número do protocolo da consulta (20704/2019).
- CFOP: Utilizar o CFOP 5.949 (“outra saída de mercadoria ou prestação de serviço não especificado”), por não haver um código específico para essa situação.
É fundamental que a aquisição desses insumos pela Consulente seja escriturada com o CFOP 1.128 (“compra para utilização na prestação de serviço sujeita ao ISSQN”), sem direito a crédito de ICMS.
Entrega Direta por Fornecedores Paulistas: Quando é Possível?
A segunda dúvida da Consulente diz respeito à possibilidade de os fornecedores paulistas entregarem os materiais diretamente nos estabelecimentos dos clientes. A resposta da SEFAZ-SP para essa questão depende diretamente da condição de contribuinte do ICMS tanto da prestadora de serviço quanto de seus clientes.
Cenário 1: Prestador e Tomador do Serviço NÃO SÃO Contribuintes do ICMS
Se tanto a empresa prestadora do serviço (Consulente) quanto o tomador do serviço (cliente) não forem contribuintes do ICMS, a entrega direta pelo fornecedor é permitida. Nesses casos, aplica-se o artigo 125, § 7º, do RICMS/2000.
Este artigo estabelece que, em vendas para destinatário não contribuinte do imposto, a entrega da mercadoria pode ocorrer em qualquer um de seus domicílios ou no domicílio de outra pessoa, desde que esta também seja não contribuinte do ICMS. É crucial que o local da entrega esteja expressamente indicado no documento fiscal relativo à operação.
Cenário 2: Prestador ou Tomador do Serviço SÃO Contribuintes do ICMS
A situação muda drasticamente quando o prestador do serviço (Consulente) ou o tomador do serviço (cliente), ou ambos, são contribuintes do ICMS. Neste caso, a legislação paulista não prevê dispositivo que possibilite a remessa direta de materiais de uso e consumo por fornecedor para um estabelecimento de terceiro (o cliente), quando o adquirente ou o destinatário da remessa são contribuintes do ICMS.
A SEFAZ-SP esclarece que a disciplina da venda à ordem (artigo 129, § 2º, do RICMS/2000) não se aplica a materiais de consumo, pois esta pressupõe duas operações mercantis, o que não ocorre na utilização de insumos para prestação de serviço.
No entanto, mesmo que a entrega direta não seja permitida nessa situação, não há impedimento para que a prestadora de serviços retire os materiais de uso e consumo dos estabelecimentos dos fornecedores paulistas e, por sua própria conta, efetue o transporte até os locais de prestação do serviço (estabelecimentos dos clientes).
Conclusão
A Resposta à Consulta Tributária 20704/2019 fornece um guia valioso para empresas de limpeza e conservação, ou outras prestadoras de serviço que utilizam materiais de uso e consumo em suas operações. É fundamental compreender as nuances da legislação do ICMS, especialmente no que se refere à emissão de documentos fiscais e às condições para a entrega direta de materiais por fornecedores. A correta aplicação dessas diretrizes evita problemas fiscais e garante a conformidade da empresa com a legislação tributária.