A reforma tributária brasileira, uma das mais ambiciosas das últimas décadas, está em curso e avança com a promessa de modernizar o sistema fiscal do país, historicamente marcado pela complexidade, insegurança jurídica e multiplicidade de tributos. Neste contexto, dois instrumentos emergem como centrais para a nova arquitetura do sistema: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).
A adoção desses tributos exigirá dos profissionais da área contábil, fiscal e jurídica um reposicionamento técnico imediato, especialmente no que se refere à apuração, planejamento tributário e conformidade com as novas normas que vêm sendo editadas para viabilizar a transição.
CBS: Contribuição sobre a Receita Bruta
A CBS é uma contribuição de competência federal que foi desenhada para substituir o PIS e a Cofins, tributos que, embora relevantes para o financiamento da seguridade social, são hoje apontados como fontes de litígio e distorção na tributação do consumo.
Com alíquota uniforme e incidência sobre a receita bruta, a CBS seguirá o regime não cumulativo, permitindo o crédito de insumos adquiridos para a atividade empresarial. Entre seus principais objetivos, destacam-se:
- Padronização da base de cálculo, com redução de exceções e regimes especiais;
- Simplificação de obrigações acessórias, eliminando o modelo multifásico e facilitando a escrituração fiscal digital;
- Redução do contencioso tributário, especialmente em torno da definição de insumos e exclusões da base de cálculo;
- Neutralidade econômica, ao minimizar distorções setoriais e evitar a tributação em cascata.
A implementação da CBS, no entanto, demandará profundas adaptações nos sistemas ERP, nos cadastros fiscais e nas rotinas de apuração das empresas, além de uma reavaliação das estruturas contratuais e das estratégias de precificação.
IBS: Imposto sobre Bens e Serviços
Já o IBS, de natureza subnacional e compartilhada entre União, estados e municípios, constitui o pilar estruturante da reforma constitucional tributária. Inspirado no modelo internacional do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), o IBS promoverá a unificação de tributos hoje dispersos, tais como:
- ICMS (estadual);
- ISS (municipal);
- IPI, PIS e Cofins (parcialmente federais, em conjunto com a CBS).
Entre suas características centrais estão:
- Regime não cumulativo pleno, com direito amplo ao crédito;
- Tributação no destino, com eliminação da guerra fiscal e redistribuição mais justa da receita entre entes federativos;
- Alíquota uniforme por produto ou serviço, com possibilidade de diferenciação por finalidade econômica, mas sem multiplicidade de exceções;
- Competência conjunta, com arrecadação centralizada e repasse automático aos entes.
A transição para o IBS será gradual, conforme prevê o texto aprovado na reforma constitucional (PEC 45/2019), estendendo-se até 2033. Esse período, embora extenso, exige desde já planejamento estratégico tributário, com mapeamento de impactos financeiros, reorganização de processos internos e análise contratual minuciosa.
A urgência da adaptação técnica e estratégica
A antecipação à entrada em vigor da CBS e do IBS não é apenas um diferencial competitivo — trata-se de uma necessidade técnica urgente. A complexidade do sistema atual será, em parte, substituída por novas exigências de conformidade, interoperabilidade de sistemas e transparência fiscal.
As empresas que não se prepararem poderão enfrentar:
- Riscos de autuação por descumprimento de obrigações acessórias reformuladas;
- Dificuldades na recuperação de créditos tributários, especialmente nos primeiros anos de vigência dos novos tributos;
- Desvantagem operacional, frente à concorrência mais bem adaptada às novas regras.
Para os profissionais da área tributária, as competências esperadas passam a incluir:
- Domínio dos regimes de transição e das novas bases legais que regulamentam a CBS e o IBS;
- Conhecimento aprofundado sobre tributação de bens, serviços e receitas, considerando o fim das segmentações artificiais entre produtos e serviços;
- Capacidade analítica para propor reestruturações fiscais, societárias e contratuais, de forma a preservar a competitividade e a conformidade fiscal das organizações.
Considerações finais
A reforma tributária representa uma mudança de paradigma no sistema fiscal brasileiro. Se, por um lado, promete simplificação, racionalidade e justiça fiscal, por outro, impõe grandes desafios de transição, atualização normativa e requalificação profissional.
A atuação proativa dos profissionais tributários, contadores, advogados e gestores será determinante para o sucesso da implementação da CBS e do IBS nas organizações. É necessário revisar rotinas, atualizar sistemas de gestão fiscal e tributária, acompanhar a regulamentação infraconstitucional e participar ativamente do debate técnico-jurídico que moldará a aplicação prática da nova legislação.
Trata-se de um momento decisivo para a estrutura tributária brasileira e, mais ainda, para aqueles que são responsáveis por torná-la viável no cotidiano das empresas.