Decadência da China: Crônica de uma Morte Anunciada – Uma Análise Crítica

FISCAL E TRIBUTARIO

A narrativa do “milagre econômico chinês” tem sido uma constante nas últimas décadas, mas para alguns observadores e estudiosos, essa história de sucesso linear é, na verdade, uma construção artificial, um crescimento forçado e insustentável, mascarado por camadas de propaganda e sustentado por pilares frágeis. Essa é a visão de Frank Dikötter, um historiador holandês que dedicou os últimos 20 anos a estudar a China Comunista, autor de obras que desvendam as nuances desse regime.

Dikötter, cuja análise serve de base para este artigo, argumenta que o país está sob um risco permanente de colapso sistêmico. Vamos aprofundar nos pontos que ele e outros pensadores utilizam para fundamentar essa perspectiva.

Xi Jinping: Um Ditador Marxista com Monopólio do Poder

A figura central na atual China é Xi Jinping, descrito por Dikötter como um “ditador marxista” à semelhança de Stálin. Sua visão de mundo é polarizada entre socialismo e capitalismo, com uma aversão declarada ao último. Sob sua liderança, a China consolidou um regime de monopólio total de poder, onde a dissidência é severamente reprimida e a centralização atinge níveis extremos.

Esse cenário se alinha com os Quatro Pontos Cardeais que, segundo a análise, guiam o regime chinês:

  1. Marxismo: O Estado detém o controle dos meios de produção.
  2. Leninismo: Caracterizado pela centralização absoluta do poder.
  3. Maoísmo: Uma linha ideológica que reforça o papel do partido e o controle sobre a sociedade.
  4. Ditadura do Proletariado: Um regime de mão de ferro justificado pela suposta representação da classe trabalhadora.

A Economia: Uma Fachada Marxista

Apesar da abertura para o mercado global, a economia chinesa permanece fundamentalmente marxista em sua essência. O Estado mantém um controle férreo sobre os setores-chave, como bancos e energia. Além disso, a interferência governamental é imediata e brutal quando percebe qualquer ameaça ao sistema, seja no setor educacional, nas gigantes de tecnologia (as “big techs”) ou em qualquer outra área que demonstre autonomia excessiva. Essa intervenção arbitrária e a falta de um mercado livre genuíno são vistas como inibidoras da inovação e da verdadeira prosperidade.

Relações de Trabalho: Um Apartheid Interno

Um dos aspectos mais chocantes apontados é a prática de um verdadeiro “apartheid trabalhista” dentro da China. Estima-se que 40% da força de trabalho, cerca de 300 milhões de pessoas, vivem como imigrantes ilegais dentro do seu próprio país. Essas pessoas, frequentemente migrantes rurais para áreas urbanas, são desprovidas de direitos sociais básicos, acesso à saúde, previdência social e à liberdade de organização em sindicatos independentes. Essa massa de mão de obra barata e desprotegida é um dos pilares do crescimento, mas também uma bomba-relógio social.

Pilares de Crescimento Esgotados e Endividamento Crescente

O modelo de crescimento chinês, impulsionado por investimentos massivos, parece ter esgotado suas fontes:

  • Infraestrutura: O frenético ritmo de construção de autoestradas, ferrovias e aeroportos atingiu um ponto de saturação, com muitas obras de pouca utilidade econômica e alta dívida.
  • Construção Civil: Milhões de imóveis desocupados, as chamadas “cidades fantasmas”, são um testemunho do superaquecimento e da bolha imobiliária que se formou, com grandes incorporadoras à beira do colapso.
  • “Fábrica do Mundo”: A capacidade de crescimento baseado na produção em massa para exportação parece ter chegado ao seu limite, com o aumento dos custos internos e a competição global.

Essa expansão descontrolada levou a um endividamento alarmante, que ultrapassa os 200% do PIB. A dívida das ferrovias, por exemplo, alcança a cifra de 900 bilhões de dólares. Esse cenário reflete um uso ineficiente dos recursos estatais, que prioriza o crescimento a qualquer custo, em detrimento da sustentabilidade e da rentabilidade.

A Questão da Liberdade: Um Legado da Praça da Paz Celestial

Os líderes chineses aprenderam uma lição brutal com a Revolução Cultural e, mais notoriamente, com o massacre na Praça da Paz Celestial: nunca se deve dar poder ao povo. O controle social é onipresente, com vigilância maciça e repressão a qualquer forma de manifestação ou crítica. O poder, longe de estar nas mãos do povo, está concentrado em uma elite que, segundo a crítica, se assemelha a uma “máfia corrupta”.

O Colapso Anunciado: Visões de Esquerda Que Convergem

A somatória dessas características, para analistas como Dikötter, levará inevitavelmente ao colapso do modelo chinês por suas próprias contradições internas. E, para o desespero de alguns, essa conclusão não vem de autores liberais como Hayek, mas de pensadores conhecidos por suas afiliações à esquerda:

  • Slavoj Zizek: O filósofo esloveno afirma que “A China não superou o capitalismo. Ela o levou à sua forma mais obscena, sem liberdade, sem democracia, sem ilusões”. Ele acrescenta que “O Partido substituiu o mercado como novo opressor”, evidenciando a ironia de um sistema que se diz socialista, mas que exacerba as piores características do capitalismo sem suas garantias democráticas.
  • Daron Acemoglu: Em sua obra seminal Why Nations Fail (Por Que as Nações Fracassam), Acemoglu, coautor com James A. Robinson, argumenta que “A principal causa do sucesso ou fracasso econômico dos países está na qualidade de suas instituições políticas e econômicas”. No caso da China, ele categoriza suas instituições como “extrativas”, que “concentram poder e riqueza em elites, que suprimem a livre iniciativa, desincentivam a inovação e promovem a dependência estatal”. Esse modelo, apesar do crescimento inicial, é inerentemente insustentável a longo prazo.

Conclusão

A visão de uma China em ascensão imparável é desafiada por uma análise mais profunda e crítica, que aponta para fragilidades estruturais e contradições internas do regime. A centralização do poder, a economia controlada, as violações de direitos trabalhistas e o endividamento massivo são elementos que, segundo esses pensadores, indicam um caminho para um colapso que, para eles, é uma “morte anunciada”.

Será que é por estas características que alguns regimes buscam inspiração no modelo chinês para implantar a censura e o controle social em outras partes do mundo? A questão permanece aberta para reflexão e debate.

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