A devolução de mercadorias é um processo fundamental na gestão fiscal e contábil de qualquer empresa, visando anular os efeitos de uma operação de compra anterior. Quando se trata de material de uso ou consumo, a complexidade aumenta devido às particularidades tributárias e à necessidade de seguir rigorosamente a legislação. Este artigo detalha os procedimentos, as classificações fiscais e as observações importantes para garantir uma devolução eficiente e em conformidade com a legislação.
O Conceito e a Anulação da Operação Anterior
A devolução de mercadoria, conforme o inciso IV do artigo 4º do RICMS/2000, tem como objetivo anular todos os efeitos de uma operação anterior. Para que essa anulação seja efetiva, a Nota Fiscal de devolução deve reproduzir fielmente todos os elementos constantes da Nota Fiscal original emitida pelo fornecedor. Isso inclui detalhes como valores, descrições dos produtos, impostos e informações do emitente e destinatário. A Resposta à Consulta Tributária 18296/2018 reforça essa premissa, destacando a necessidade de uma correlação exata entre os documentos fiscais.
Pontos Cruciais na Emissão da Nota Fiscal de Devolução
Para que a devolução seja processada corretamente, alguns pontos são indispensáveis na emissão da Nota Fiscal:
- Conformidade com a NF de Compra: A devolução deve espelhar as informações da nota fiscal de compra original.
- Devolução Parcial: Se a devolução for parcial, os valores devem ser rateados, ou seja, apenas a proporção correspondente aos itens devolvidos deve ser discriminada na Nota Fiscal.
- Destaque de ICMS: Caso a NF de compra original tenha destaque de ICMS, o mesmo valor, base de cálculo e alíquota devem ser replicados na NF de devolução em campo próprio.
- IPI Devolvido: O valor do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) referente à devolução deve ser informado no campo “IPI Devolvido”. Esse valor deve ser somado ao total da nota fiscal. Com a NF-e 4.0, o IPI Devolvido passou a ter uma tag específica (
vIPIDevol
), simplificando o processo para não contribuintes do IPI. - ICMS ST na Compra: Se houver ICMS Substituição Tributária (ICMS ST) na NF de compra, esse valor deve constar em “outras despesas acessórias” na NF de devolução. É crucial mencionar nos dados adicionais que esse valor se refere ao ICMS-ST e somá-lo ao total da nota fiscal.
Códigos Fiscais de Operações e Prestações (CFOP)
A escolha do CFOP correto é vital para a correta classificação fiscal da devolução:
- CFOP 5.556 ou 6.556: Utilizado para devoluções de mercadorias adquiridas com CFOPs como 5.101/5.102 (venda de produção do estabelecimento/mercadoria adquirida ou recebida de terceiros) ou 6.101/6.102 em operações interestaduais. A Natureza da Operação será “Devolução de compra de material de uso ou consumo”.
- CFOP 5.413 ou 6.413: Referente à devolução de mercadorias adquiridas com CFOPs como 5.405 (venda de mercadoria adquirida ou recebida de terceiros em operação com mercadoria sujeita ao regime de substituição tributária, na condição de contribuinte substituído), 6.403 ou 6.404.
- CFOP 5.412: Específico para a devolução de bem do ativo imobilizado em operação com mercadoria sujeita ao regime de substituição tributária, cuja entrada tenha sido classificada no CFOP 1.406.
Códigos de Situação Tributária (CST)
A correta aplicação dos CSTs é essencial:
- CST ICMS: Tributado
- CST IPI: Tributado
- CST do PIS/COFINS: 08 – Operação sem Incidência da Contribuição
Além disso, é fundamental incluir nos dados adicionais da Nota Fiscal de devolução os dados completos da nota fiscal de aquisição original e o motivo claro da devolução.
Crédito de Imposto e Sua Escrituração
A Resposta à Consulta 18296/2018 e o artigo 66, § 3º, do RICMS/2000 esclarecem que o contribuinte poderá creditar-se do ICMS incidente na operação anterior. Esse crédito deve ser escriturado no período em que ocorrer a entrada física da mercadoria no estabelecimento. No entanto, se o imposto não foi aproveitado na aquisição, ele pode ser apropriado no momento da mudança de destinação (ou seja, quando a mercadoria é devolvida e deixa de ser destinada ao uso e consumo). Nestes casos, o crédito é considerado extemporâneo (artigo 65, I, “b” e caput do RICMS/2000) e deve seguir os procedimentos específicos para créditos extemporâneos.
A escrituração do ICMS da devolução deve ser realizada no LRICMS, no quadro “Crédito do Imposto” – “Outros Créditos”, considerando a não apropriação do crédito na aquisição. Na GIA, utilizar o código 7.99, e na EFD-ICMS/IPI, o código de ajuste SP020799 (“Outras Hipóteses – Preenchida pelo contribuinte”).
Diferencial de Alíquotas (Difal)
Em caso de devolução de mercadoria que tenha sido sujeita ao Diferencial de Alíquotas (Difal), o imposto debitado será lançado como crédito no quadro “Crédito do Imposto – Estornos de Débitos” do livro Registro de Apuração do ICMS, com a expressão “§ 3º do Art. 117 do RICMS”.
Operações Interestaduais de Devolução
Para operações interestaduais de devolução, o Artigo 57 do RICMS/SP e o Convênio ICMS 54/00 estabelecem que a mesma base de cálculo e alíquota constantes no documento fiscal que acobertou a operação original de recebimento da mercadoria ou bem devem ser aplicadas. Isso garante a uniformidade e a anulação completa dos efeitos fiscais da operação anterior.
Nota Fiscal de Devolução Única vs. Múltiplas Notas
A RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 6245/2015 esclarece que, em regra, deve ser emitida uma Nota Fiscal de devolução específica para cada Nota Fiscal de aquisição de mercadoria que se pretende anular. Isso garante que todos os elementos da operação original sejam reproduzidos corretamente, mantendo a conformidade fiscal.
Compreender e aplicar corretamente esses procedimentos é essencial para evitar problemas fiscais e garantir a conformidade nas operações de devolução de material de uso ou consumo. A atenção aos detalhes da Nota Fiscal original e a correta classificação nos documentos de devolução são chaves para o sucesso desse processo.