A implementação da Reforma Tributária, um marco na reestruturação do sistema fiscal brasileiro, traz consigo diversas questões cruciais para os contribuintes. Uma das mais relevantes e que ainda gera debates é a definição precisa da base de cálculo do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS), os novos tributos que substituirão o complexo emaranhado de impostos existentes.
Nesse contexto de transição e incertezas, a Nota Técnica 2025.002 – RTC, que detalha os ajustes de leiaute da Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) e da Nota Fiscal de Consumidor Eletrônica (NFC-e) para a incorporação dos novos tributos, surge como um importante indicativo de como a Receita Federal visualiza a composição dessa base de cálculo. A nota técnica apresenta a seguinte fórmula:
vBC (Base de Cálculo IBS/CBS) =
(+) vProd (Valor dos Produtos)
(+) vServ (Valor dos Serviços)
(+) vFrete (Valor do Frete)
(+) vSeg (Valor do Seguro)
(+) vOutro (Outras Despesas Acessórias)
(+) vII (Imposto de Importação)
(-) vDesc (Descontos Incondicionais)
(-) vPIS (Contribuição para o PIS/Pasep)
(-) vCOFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social)
(-) vICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços)
(-) vICMSUFDest (Diferencial de Alíquota do ICMS)
(-) vFCP (Fundo de Combate à Pobreza)
(-) vFCPUFDest (Fundo de Combate à Pobreza – Diferencial de Alíquota)
(-) vICMSMono (ICMS Monofásico)
(-) vISSQN (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza)
(+) vIS (Imposto Seletivo)
A fórmula proposta pela Nota Técnica 2025.002 é clara em um ponto fundamental: a base de cálculo do IBS e da CBS não será cumulativa com os tributos atuais. Pelo contrário, os valores correspondentes ao ICMS, PIS, COFINS, ISS e outros tributos serão explicitamente deduzidos do valor da operação.
O que efetivamente compõe a base de cálculo, segundo a NT, são os valores intrínsecos à operação: o preço dos produtos, o custo dos serviços prestados, o valor do frete, os seguros envolvidos, outras despesas acessórias diretamente relacionadas à transação e o Imposto de Importação (II). A dedução dos descontos incondicionais também se mostra lógica, pois estes reduzem o valor final da operação.
No entanto, uma lacuna crucial reside na Lei Complementar nº 214/2025, o diploma legal que institui a Reforma Tributária. A lei, em seu texto atual, não detalha de forma explícita a metodologia de cálculo apresentada na nota técnica. Essa ausência de clareza na legislação abre margem para interpretações divergentes por parte dos contribuintes e do próprio fisco, gerando um cenário de insegurança jurídica.
Para mitigar essa incerteza, o Projeto de Lei (PL) nº 16/2025 tramita no Congresso Nacional com o objetivo de incorporar expressamente na lei os critérios técnicos delineados na Nota Técnica 2025.002. A aprovação desse projeto seria um passo importante para conferir maior segurança jurídica aos contribuintes, alinhando a prática operacional com a legislação tributária.
A Polêmica Inclusão do Imposto Seletivo (IS):
Um ponto que merece atenção especial na fórmula apresentada pela Nota Técnica é a inclusão do Imposto Seletivo (IS) como um componente positivo da base de cálculo do IBS e da CBS. Essa inclusão levanta questionamentos, pois a legislação atual não prevê essa sistemática de forma generalizada.
O artigo 69 da Lei Complementar nº 214/2025 estabelece uma única hipótese em que o IS pode integrar a base de cálculo do IBS/CBS: no caso do IS incidente na importação de bens. A lógica por trás disso reside no fato de que o IBS e a CBS visam tributar o valor total do bem ou serviço internalizado no país.
Contudo, a fórmula da Nota Técnica 2025.002 parece indicar que todo o IS, inclusive aquele incidente sobre a produção nacional, integraria a base de cálculo dos novos tributos. Essa interpretação contraria o texto legal vigente e, novamente, fomenta a insegurança jurídica.
Até que a legislação seja devidamente ajustada ou regulamentada de forma clara, a dúvida persiste: o Imposto Seletivo deve realmente compor a base de cálculo do IBS e da CBS em operações domésticas? Essa é uma questão crucial que precisa ser resolvida para garantir a previsibilidade e a conformidade tributária para os contribuintes brasileiros na nova era da Reforma Tributária. A clareza na definição da base de cálculo é fundamental para o bom funcionamento do novo sistema e para evitar litígios futuros entre o fisco e os contribuintes.