IRPJ e CSLL na Construção Civil: A Receita Federal e a Nova Lente da Empreitada Total

FISCAL E TRIBUTARIO

O cenário tributário brasileiro, notório por sua complexidade e frequentes mudanças, exige constante atenção das empresas para garantir a conformidade e a otimização fiscal. No setor da construção civil, um dos pilares da economia, a Receita Federal acaba de emitir um novo entendimento que redefine os critérios para a aplicação dos percentuais de presunção do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) no regime do Lucro Presumido. A Solução de Consulta COSIT nº 80/2025 representa uma reformulação significativa, revogando entendimentos anteriores e impactando diretamente a apuração dos tributos para diversas atividades do segmento.

A Distinção Crucial: Empreitada Total com Fornecimento de Materiais

A grande virada trazida pela COSIT nº 80/2025 reside na clareza sobre quais atividades podem se beneficiar dos percentuais reduzidos de presunção. A partir de agora, serviços que antes poderiam gerar dúvidas, como instalações elétricas, hidráulicas, sanitárias, de gás, sistemas de prevenção contra incêndio, climatização, pintura, e até mesmo a instalação de portas, janelas, tetos e armários embutidos, passarão a se enquadrar nos percentuais de 8% para o IRPJ e 12% para a CSLL.

Contudo, essa benesse não é universal. A condição primordial para a aplicação desses percentuais reduzidos é que tais serviços sejam executados sob o regime de empreitada total, com o fornecimento integral dos materiais pelo empreiteiro, e que tais materiais sejam incorporados de forma definitiva à obra.

Essa delimitação é crucial e alinhada ao conceito de “construção” no sentido mais amplo, onde o empreiteiro assume a responsabilidade pela obra completa ou por uma parte substancial dela, incluindo a aquisição e aplicação dos insumos que se tornam parte integrante do imóvel. A Solução de Consulta reconhece, assim, a natureza mista (serviço e venda de bens) inerente a essas atividades, mas condiciona o benefício à integralidade da responsabilidade do empreiteiro pela entrega do material incorporado.

O Outro Lado da Moeda: Manutenção e Itens Não Incorporados

Em contrapartida, a COSIT nº 80/2025 mantém o percentual de 32% para atividades que não se enquadram na definição de empreitada total com incorporação definitiva de materiais. Isso inclui, notadamente:

  • Serviços de Manutenção: Atividades como a manutenção em redes elétricas ou hidráulicas existentes, que não envolvem a construção ou reforma estrutural com incorporação de novos materiais de forma permanente ao imóvel.
  • Instalação de Divisórias Móveis: Este é um exemplo clássico de material que, mesmo instalado por um empreiteiro, não se incorpora permanentemente ao imóvel, podendo ser removido sem danificar a estrutura.

A Receita Federal fundamenta essa distinção no conceito civilista de incorporação ao bem imóvel, conforme previsto nos artigos 82 e 84 do Código Civil Brasileiro, que distinguem bens imóveis por natureza, por acessão física artificial e por destinação. Adicionalmente, a fundamentação se apoia no disposto na Instrução Normativa RFB nº 1.234/2012, que regulamenta a retenção de tributos sobre pagamentos efetuados por órgãos e entidades da administração pública federal a pessoas jurídicas.

A Análise Jurídica: Chave para a Correta Apuração

Diante desse novo panorama, a análise jurídica da natureza dos materiais e da forma de execução contratual torna-se essencial para a correta apuração dos tributos. As empresas do setor de construção civil, especialmente aquelas que atuam em segmentos mais específicos ou que oferecem uma gama variada de serviços, deverão revisar minuciosamente seus contratos e suas operações.

A distinção entre uma “empreitada total com fornecimento de materiais e incorporação definitiva” e uma “prestação de serviços em geral” é agora o cerne da questão tributária. Um contrato que preveja a instalação de um sistema de climatização, mas onde o material seja fornecido pelo cliente, por exemplo, poderá não se beneficiar dos percentuais reduzidos. Da mesma forma, um contrato de manutenção preventiva ou corretiva, por sua própria natureza, se encaixará na alíquota de 32%.

Revogação de Entendimentos Anteriores e Efeito Vinculante

A Solução de Consulta COSIT nº 80/2025 revoga expressamente os entendimentos anteriores constantes nas Soluções de Consulta COSIT nº 27/2015 e nº 138/2023. Essa revogação reforça a nova diretriz da Receita Federal e a necessidade de as empresas se adequarem imediatamente.

É importante frisar que as Soluções de Consulta COSIT têm efeito vinculante no âmbito da Receita Federal. Isso significa que elas devem ser seguidas por todos os fiscais e unidades da Receita, conferindo maior segurança jurídica aos contribuintes que se enquadram nos critérios estabelecidos.

Reavaliar a Sistemática de Apuração: Um Imperativo

Empresas que atuam com prestação de serviços técnicos em edificações — especialmente aquelas que não integram obras completas, mas realizam serviços pontuais — devem reavaliar sua sistemática de apuração do IRPJ e CSLL no regime do Lucro Presumido. A distinção objetiva entre empreitada total com fornecimento de materiais e prestação de serviços em geral passa a ser o fator determinante para a aplicação dos percentuais de presunção.

A COSIT nº 80/2025, portanto, não é apenas uma nova interpretação; é um convite à revisão estratégica da forma como os contratos são elaborados e executados, e como os serviços são classificados para fins tributários. A adequação a essa nova orientação é fundamental para evitar autuações fiscais e garantir a correta gestão tributária no dinâmico setor da construção civil. A busca por assessoria especializada para analisar cada caso concreto será mais do que nunca um investimento estratégico para o planejamento fiscal das empresas.

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