O Futuro dos Benefícios de ICMS: Entenda a Compensação Pós-Reforma Tributária (Art. 384 e 385) – LC 214/2025

CBS FISCAL E TRIBUTARIO IBS Reforma Tributária

A Emenda Constitucional nº 132, de 20 de dezembro de 2023, que implementou a Reforma Tributária no Brasil, trouxe mudanças significativas para o sistema de tributação do consumo, especialmente no que tange ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Um dos pontos cruciais dessa reforma é a redução gradual dos benefícios onerosos de ICMS e a compensação que será oferecida aos seus titulares. Os artigos 384 e 385 dessa Lei Complementar detalham esse processo, estabelecendo as diretrizes para o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiro-Fiscais.


O Que Muda para os Beneficiários de ICMS?

A partir de 1º de janeiro de 2029, os titulares de benefícios onerosos de ICMS, sejam pessoas físicas ou jurídicas, enfrentarão uma redução gradual desses benefícios, conforme previsto no Art. 128, § 1º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Para mitigar os impactos dessa mudança, será ativado o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiro-Fiscais, instituído pelo Art. 12 da Emenda Constitucional nº 132/2023.

A compensação, que se estenderá até 31 de dezembro de 2032, visa garantir uma transição mais suave para as empresas e setores que hoje dependem desses incentivos fiscais. É fundamental que os beneficiários compreendam os critérios e os procedimentos para a habilitação e apuração dos valores a serem compensados.


Quem Tem Direito à Compensação? Critérios Essenciais

O Art. 384, parágrafo único, estabelece claramente a quem se aplica essa compensação:

  • Benefícios Regularmente Concedidos: A compensação é direcionada a titulares de benefícios onerosos concedidos até 31 de maio de 2023, mesmo que tenham sido prorrogados ou renovados posteriormente. É crucial que esses benefícios tenham sido devidamente registrados e depositados, conforme a Lei Complementar nº 160/2017, e que as condições exigidas pela norma concessiva tenham sido cumpridas pontualmente.
  • Migração de Programas: Também serão contemplados programas ou benefícios que migraram devido a mudanças na legislação estadual entre 31 de maio de 2023 e a promulgação da EC nº 132/2023, ou que estavam em processo de migração. Nesses casos, o ato concessivo deve ser emitido pela unidade federada em até 90 dias após a publicação desta Lei Complementar.
  • Exceções: É importante ressaltar que a compensação não se aplica aos titulares de benefícios decorrentes do § 2º-A do Art. 3º da Lei Complementar nº 160/2017.

Desvendando os Termos: O Que Significa Cada Conceito?

Para uma compreensão aprofundada do processo de compensação, o Art. 385 da Lei Complementar define os termos-chave:

  • Benefícios Onerosos: São as vantagens econômicas resultantes de isenções, incentivos fiscais ou financeiro-fiscais concedidos pelos estados por tempo determinado e sob condições específicas, nos moldes do Art. 178 do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966).
  • Titulares de Benefícios Onerosos: São as pessoas (físicas ou jurídicas) que possuem o direito de usufruir desses benefícios, desde que estejam em dia com as condições exigidas pela norma concessiva.
  • Prazo Certo: Refere-se ao período estabelecido para a fruição do benefício, com data limite de 31 de dezembro de 2032.
  • Condição (na forma do Art. 178 do CTN): Diz respeito às contrapartidas previstas no ato concessivo ou na legislação estadual/distrital, que geram ônus ou restrições à atividade do beneficiário. Exemplos incluem a implementação ou expansão de empreendimentos econômicos que agreguem valor, a geração de novos empregos, a limitação de preços de venda ou restrições de contratação de fornecedores.
    • Atenção: Não são consideradas “condições” o mero cumprimento de deveres legais obrigatórios para todos os contribuintes, declarações de intenções sem ônus efetivos, ou contribuições a fundos estaduais/distritais vinculadas à fruição do benefício, salvo se a totalidade desses recursos for empregada em obras de infraestrutura pública ou projetos que fomentem a atividade econômica do setor privado (constituídos até 31 de maio de 2023).
  • Repercussão Econômica: Trata-se da parcela do ICMS apropriada pelo contribuinte devido ao benefício fiscal (crédito presumido, crédito outorgado, etc.), ou do desconto obtido pela antecipação de pagamento. No caso de ampliação do prazo de pagamento do ICMS, considera-se o ganho financeiro não realizado pela redução das alíquotas do ICMS, calculado com base em parâmetros como a Taxa Selic.
  • Ato Concessivo de Benefícios Onerosos: É o ato administrativo ou o enquadramento em norma jurídica que concretiza a concessão do benefício.
  • Implementação/Expansão de Empreendimento Econômico: Definem a criação de um novo empreendimento por empresa não domiciliada na unidade federada ou a ampliação da capacidade/modernização/diversificação de um empreendimento existente, respectivamente.

O Papel da Receita Federal do Brasil (RFB)

A Receita Federal do Brasil (RFB) desempenhará um papel central na gestão dessas compensações (Art. 386). Suas competências incluem:

  • Estabelecer a forma e as informações dos requerimentos de habilitação.
  • Expedir normas complementares e analisar os requerimentos de habilitação.
  • Definir as informações para escrituração fiscal e contábil-fiscal e o formato da demonstração de apuração do crédito.
  • Processar e revisar as apurações de crédito, reconhecendo e autorizando os pagamentos.
  • Estabelecer parâmetros de risco para automatizar o reconhecimento e pagamento dos créditos.
  • Disciplinar a retificação de informações, devolução de pagamentos indevidos e retenção de créditos subsequentes.
  • Regulamentar prazos e outros aspectos procedimentais, sempre garantindo o direito à ampla defesa e ao contraditório.

Além disso, o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil terá atribuições privativas, como elaborar decisões sobre o reconhecimento do direito à compensação e do crédito, examinar a contabilidade para revisar a apuração de crédito, orientar os titulares e constituir o crédito decorrente de indébitos (Art. 387).


Habilitação para a Compensação: Prazos e Requisitos

Para ser beneficiário da compensação, o titular do benefício oneroso deverá ser habilitado pela RFB. O requerimento de habilitação, que será regulamentado pela RFB, deve ser apresentado no período de 1º de janeiro de 2026 a 31 de dezembro de 2028 (Art. 388, Parágrafo único).

Os requisitos para a habilitação são rigorosos (Art. 389):

  • Ser titular de benefício oneroso concedido por unidade federada.
  • Possuir ato concessivo que atenda a critérios específicos de prazo (até 31/05/2023 ou no prazo de migração), com condições e contrapartidas expressas, e que esteja em vigor no período da compensação.
  • Ter efetuado o registro e depósito previstos na Lei Complementar nº 160/2017, se aplicável.
  • Cumprir pontualmente as condições exigidas pelo ato concessivo.
  • Apresentar as obrigações acessórias com as informações necessárias para a aferição do benefício.
  • Não possuir impedimento legal à fruição de benefícios fiscais.
  • Apresentar regularidade cadastral perante o CNPJ.

A habilitação poderá ser indeferida, suspensa ou cancelada caso o requerente não atenda ou deixe de atender a esses requisitos (Art. 390).


Demonstração, Reconhecimento e Revisão dos Créditos

Uma vez habilitado, o titular do benefício oneroso deverá informar mensalmente em sua escrituração fiscal os elementos necessários para a quantificação da repercussão econômica de cada benefício (Art. 391). O crédito será calculado mensalmente, considerando a repercussão econômica e a redução do nível dos benefícios.

A RFB processará o montante e, se não houver indícios de irregularidade ou risco, o crédito será automaticamente reconhecido e autorizado para pagamento em até 60 dias (Art. 392). Caso a RFB não se manifeste nesse prazo, o reconhecimento e a autorização serão tácitos. Se houver indícios de irregularidade ou o montante superar o limite de risco, o crédito poderá ser retido para revisão.


Autorregularização e Revisão de Créditos

A legislação prevê a autorregularização por parte do interessado caso constate irregularidades na apuração do crédito. A retificação das informações na escrituração fiscal e a devolução imediata de valores indevidamente recebidos são obrigatórias, acrescidas de juros (Art. 393). A RFB poderá, inclusive, compensar de ofício débitos com créditos futuros.

Em caso de constatação de irregularidade em procedimento de revisão, a autoridade competente lavrará despacho denegando total ou parcialmente o crédito. Caso já tenha ocorrido o pagamento, o interessado será notificado a devolver os valores indevidamente recebidos, acrescidos de juros, ou poderá autorizar a compensação com créditos futuros (Art. 394).


A complexidade e a abrangência desses artigos exigem atenção redobrada dos beneficiários de ICMS. A compreensão detalhada dessas regras e a conformidade com os prazos e requisitos serão cruciais para garantir o direito à compensação e minimizar os impactos da Reforma Tributária. Recomenda-se buscar assessoria especializada para navegar por esse novo cenário.

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