A tão aguardada Reforma Tributária prometeu simplificação e o fim do “efeito cascata” na tributação do consumo. No entanto, as primeiras orientações técnicas para a adaptação dos sistemas fiscais já levantam questões polêmicas que podem impactar diretamente a carga tributária das empresas. Uma dessas discussões surge com a Nota Técnica 2025.002 v1.01, publicada para orientar a adaptação das Notas Fiscais Eletrônicas (NF-e) ao novo cenário.
O Ponto Controverso: Imposto Seletivo na Base de Cálculo
A polêmica reside no item UB16-10 (página 23) da referida Nota Técnica. Segundo a orientação, o campo destinado à base de cálculo do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) – identificado como glBSCBS/vBC – deve incluir o valor do Imposto Seletivo (IS).
Na prática, o que isso significa? Para que uma Nota Fiscal Eletrônica seja validada, o valor do Imposto Seletivo precisa ser somado à base de cálculo do IBS e da CBS. Em outras palavras, teremos uma situação de cumulatividade, onde o IBS e a CBS incidirão sobre um valor já majorado pelo Imposto Seletivo.
A Contramão do Objetivo da Reforma?
Essa determinação da Nota Técnica gera um debate intenso. O objetivo primordial da Reforma Tributária é justamente promover a não cumulatividade plena e eliminar a tributação em cascata, que tanto onera a cadeia produtiva e dificulta a competitividade. Ao incluir o IS na base de cálculo do IBS e da CBS, a própria estrutura do novo sistema pode criar uma nova forma de cumulatividade, o que vai na contramão do propósito declarado de simplificação e desoneração do consumo.
A Lei Complementar nº 214/2025, que instituiu o novo modelo, não trata explicitamente dessa inclusão do Imposto Seletivo na base de cálculo do IBS e da CBS. Contudo, a Nota Técnica, que serve como guia para a emissão da NF-e e a parametrização dos sistemas, impõe essa exigência para a validação do documento fiscal. Essa “imposição via regulamentação técnica” sobre um ponto sensível que não está claro na lei é o cerne da controvérsia.
Impactos e a Necessidade de Acompanhamento
O impacto dessa interpretação é claro: o contribuinte poderá sofrer tributação em cascata, resultando em uma carga tributária efetiva maior do que o esperado para produtos e serviços que são sujeitos ao Imposto Seletivo. Isso é particularmente relevante para setores como bebidas, tabaco, veículos e outros bens e serviços que se enquadrem nas categorias de incidência do IS.
Diante desse cenário, é fundamental que as empresas e os profissionais da área fiscal fiquem atentos às atualizações e ao debate técnico e jurídico sobre o tema. É provável que essa questão seja objeto de intensas discussões, levando a possíveis revisões da Nota Técnica ou a novas regulamentações que esclareçam essa inclusão.
A precisão na apuração e a conformidade na emissão de documentos fiscais serão ainda mais cruciais no novo ambiente tributário. O monitoramento constante das publicações oficiais e a participação em discussões setoriais serão essenciais para mitigar riscos e garantir a correta aplicação das regras, protegendo a carga tributária das empresas.