No dia 5 de junho de 2025, o Partido Liberal (PL) ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7827 perante o Supremo Tribunal Federal (STF), com o objetivo de suspender os efeitos dos Decretos nº 12.466/2025 e nº 12.467/2025, que promoveram a majoração das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O relator sorteado para o caso foi o Ministro Alexandre de Moraes.
A ação traz argumentos robustos e complexos, que envolvem tanto a natureza jurídica do IOF quanto aspectos constitucionais relacionados à finalidade do tributo, à legalidade orçamentária, à boa-fé administrativa e aos princípios da anterioridade e da segurança jurídica.
Contexto: IOF e Sua Natureza Jurídica
O IOF é um tributo com natureza marcadamente extrafiscal, ou seja, sua função primordial não é arrecadatória, mas sim regulatória da economia, especialmente do mercado de crédito, câmbio, seguros e valores mobiliários. Por conta disso, a Constituição autoriza sua alteração por meio de decreto do Poder Executivo, o que confere grande maleabilidade ao tributo.
Contudo, essa flexibilidade não pode ser utilizada de maneira desvinculada da finalidade constitucional da norma, sob pena de configurar desvio de finalidade ou mesmo violação aos princípios da legalidade, moralidade e razoabilidade.
Argumentos Apresentados na ADI 7827
A peça inaugural da ADI 7827 apresenta uma série de fundamentos para sustentar a inconstitucionalidade dos decretos que elevaram as alíquotas do IOF. Entre os principais argumentos, destacam-se:
1. Desvio de Finalidade
Segundo a petição, os decretos foram editados não para regular o mercado financeiro, como exige a natureza extrafiscal do IOF, mas com finalidade exclusivamente arrecadatória, o que fere o princípio da legalidade tributária material.
A utilização do IOF como mero instrumento de recomposição fiscal, desvinculado de qualquer objetivo de política econômica, é apontada como afronta ao desenho constitucional do tributo.
2. Erro na Projeção de Receitas e Irregularidades no PLOA 2025
A ADI associa a majoração do IOF a erros grosseiros nas estimativas de receita do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2025, especialmente após a reintrodução do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), que teria inflado artificialmente as expectativas de arrecadação.
Ocorre que tais projeções foram posteriormente revistas, e o aumento do IOF teria surgido como resposta à frustração da arrecadação prevista, segundo sustenta o autor da ação.
3. Representação ao TCU e Erro Grosseiro
A argumentação jurídica menciona representações já feitas ao Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a existência de erro grosseiro na elaboração das estimativas orçamentárias, as quais, segundo a ADI, teriam motivado a edição dos decretos impugnados.
Essa sequência de eventos é utilizada para sustentar que o próprio Poder Executivo teria criado a situação de instabilidade fiscal que agora tenta corrigir de forma indevida por meio da majoração do IOF.
4. Violação ao Princípio da Boa-fé Administrativa (Vedação ao venire contra factum proprium)
A peça destaca que o governo não pode se valer de um erro próprio (nas estimativas orçamentárias) para justificar a adoção de medidas tributárias excepcionais, como o aumento de alíquotas, em afronta à confiança legítima dos contribuintes.
Segundo o argumento, isso configura uma forma de “venire contra factum proprium”, prática vedada pelo ordenamento jurídico por representar contradição inaceitável na atuação do Estado.
5. Violação ao Princípio da Anterioridade
Embora o IOF não esteja submetido à anterioridade anual e nonagesimal como regra geral, a ADI sustenta que o uso reiterado do tributo como instrumento arrecadatório imediato pode representar um abuso de prerrogativa, violando o espírito dos princípios constitucionais da segurança jurídica e da previsibilidade tributária.
Pedido de Medida Cautelar
A ADI solicita medida cautelar para suspensão imediata dos efeitos dos Decretos 12.466/25 e 12.467/25, sob o argumento de que sua manutenção trará graves prejuízos à economia e à segurança jurídica, especialmente no contexto de instabilidade fiscal e ausência de base legal robusta para tais alterações.
Consequências da Suspensão das Alíquotas
Caso o STF defira a medida cautelar ou julgue procedente a ação, as novas alíquotas do IOF deixarão de produzir efeitos, restabelecendo os valores anteriormente vigentes. Isso teria impacto direto sobre operações de crédito, câmbio e seguros, podendo influenciar o custo das transações financeiras e a política monetária de curto prazo.
Adicionalmente, abre-se a possibilidade de restituição de valores recolhidos indevidamente, caso o aumento seja declarado inconstitucional com efeitos retroativos.
Considerações Finais
A ADI 7827 reabre uma discussão recorrente no direito tributário brasileiro: os limites constitucionais à utilização de tributos com função extrafiscal para finalidades arrecadatórias. O julgamento pelo STF será um marco importante para definir até onde o Poder Executivo pode ir ao manejar alíquotas tributárias por decreto.
A eventual procedência da ação poderá restringir o uso do IOF como instrumento de ajuste fiscal e reforçar a necessidade de respeito aos princípios constitucionais que regem a política tributária nacional, especialmente em um momento de transição para um novo modelo trazido pela Reforma Tributária.