A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 49 reverberou profundamente no cenário tributário brasileiro, pacificando o entendimento de que a incidência do ICMS é afastada nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular. Essa mudança crucial, que impacta diretamente as operações que utilizam os CFOPs 6552 (Transferência de bem do ativo imobilizado) e 6557 (Transferência de material de uso ou consumo), levantou uma questão premente: isso significa o fim da cobrança do DIFAL em transferências interestaduais?
A resposta, como quase tudo no complexo sistema tributário brasileiro, é nuançada.
O Fim do “DIFAL Contribuinte” nas Transferências
A ADC 49, ao declarar a inconstitucionalidade da cobrança de ICMS nessas transferências, teve um impacto direto sobre o chamado “DIFAL Contribuinte”. Este é o Diferencial de Alíquotas devido quando um contribuinte do ICMS (devidamente cadastrado na Sefaz) transfere bens do ativo imobilizado ou de uso/consumo para outro estabelecimento de sua própria empresa, localizado em diferente unidade federada.
Com a decisão do STF, e as adaptações subsequentes na legislação infraconstitucional (como as previsões da LC 87/96 e Convênios ICMS 109/24 e 236/23, além de legislações estaduais como a CE-Lei 18.665/23 e o Dec. 36.368/24, no caso do Ceará, por exemplo), ficou claro que o DIFAL Contribuinte deixa de ser devido nessas operações. Afinal, se não há circulação de mercadoria para fins de ICMS entre estabelecimentos do mesmo titular, não há fato gerador para o diferencial de alíquotas.
A Permanência do “DIFAL Não Contribuinte”
No entanto, é crucial entender que a decisão do STF não extinguiu completamente o DIFAL em operações envolvendo bens do ativo imobilizado e uso/consumo. A cobrança do “DIFAL Não Contribuinte” (DIFAL-Não Contribuinte) persiste.
Vamos lembrar que existem, em geral, três tipos de DIFAL:
- DIFAL entre Contribuintes do ICMS: Aplicado quando uma empresa (contribuinte) vende para outra empresa (também contribuinte) em outro estado, e o produto é destinado ao uso/consumo ou ativo imobilizado do comprador.
- DIFAL Não Contribuinte (Difal EC 87/15): Aplicado quando uma empresa (contribuinte do ICMS) vende para um não contribuinte do ICMS (Pessoa Física ou Pessoa Jurídica não contribuinte) em outro estado.
- DIFAL de Transferência (Antigo DIFAL Contribuinte): O que foi impactado pela ADC 49.
A persistência da cobrança do DIFAL Não Contribuinte se dá em vista do deslocamento físico de bens (ativo imobilizado e uso/consumo) entre estabelecimentos que são não contribuintes do ICMS, ou seja, quando uma empresa remete bens para uma filial, por exemplo, que não possui inscrição estadual e, portanto, não é contribuinte do ICMS. Nesses casos, o fato gerador do DIFAL ocorre no destino, e o imposto é devido à unidade federada onde ocorrer efetivamente a entrada física da mercadoria ou bem.
O Que Pensar Sobre o Tema?
A ADC 49 representou um avanço significativo na desburocratização e na simplificação do sistema tributário, ao eliminar uma cobrança de ICMS que ia de encontro à lógica do imposto sobre a circulação jurídica de mercadorias. A decisão trouxe alívio para grandes empresas com múltiplos estabelecimentos, que arcavam com uma carga tributária desnecessária e complexa em suas movimentações internas.
Contudo, a distinção entre o DIFAL Contribuinte (agora extinto nas transferências entre mesmos titulares) e o DIFAL Não Contribuinte é fundamental. Ela reforça a complexidade do DIFAL como um todo, que continua a ser um ponto de atenção para os contribuintes. A persistência da cobrança do DIFAL Não Contribuinte em certas situações de transferência sublinha a necessidade de um planejamento tributário cuidadoso e de uma compreensão aprofundada das nuances da legislação, que ainda está em constante adaptação pós-decisão do STF.
Para as empresas, o recado é claro: as transferências internas de bens do ativo imobilizado e de uso/consumo entre estabelecimentos do mesmo CNPJ não gerarão mais o DIFAL que antes era devido entre contribuintes. No entanto, a atenção deve ser redobrada para operações que envolvam destinos que não são contribuintes do ICMS, onde a cobrança do DIFAL permanece.